25 de maio de 2012

COMO DIZER O SILÊNCIO? - Natalia Correia



Como dizer o silêncio?
Se em folhagem de poema
me catais anacolutos
é vossa a fraude. A gema
não desce a sons prostitutos.

O saltério, diletante,
fere a Musa com um jasmim?
Só daí para diante
da busca estará o fim.

Aberta a porta selada,
sou pensada já não penso. 
Se a Musa fica calada
como dizer o silêncio?

Atirar pérola a porco? 
Não me queimo na parábola. 
Em mãos que brincam com o fogo 
é que eu não ponho a espada. 

Dos confins, o peristilo 
calo com pontas de fogo, 
e desse casto sigilo 
versos são só desafogo. 

E também para que me lembrem 
deixo-os no mercado negro, 
que neles glórias se vendem 
e eu não sou só desapego. 

Raiz de Deus entre os dentes, 
aí, pára a transmissão. 
Ultra-sons dessas nascentes 
só aves entenderão. 

Natália Correia Poesia Completa Publicações Dom Quixote 1999.

Açoreana, natural da Ilha de São Miguel, Natália de Oliveira Correia nasceu a 13 de Setembro de 1923. Veio, ainda criança, estudar para Lisboa iniciando muito cedo a sua actividade literária. Figura importante da poesia portuguesa contemporânea, trabalha, também, a sua criatividade como ensaísta e romancista, passando pelo teatro e investigação literária. Figura destacada da luta contra o fascismo, viu vários dos seus livros serem apreendidos pela censura, tendo sido condenada a três anos de prisão, com pena suspensa, por abuso de liberdade de imprensa.Foi eleita deputada pelo Partido Social Democrata, passando depois a independente. Colaborou com frequência em diversas publicações portuguesas e estrangeiras. A sua obra está traduzida em várias línguas. Morreu em Lisboa a 16 de Março de 1993. Algumas obras importantes são: Obras poéticas: Rio de Nuvens (1947), Poemas (1955), Dimensão Encontrada (1957), Passaporte (1958), Comunicação (1959), Cântico do País Imerso (1961), O Vinho e a Lira (1966), Mátria (1968), As Maçãs de Orestes (1970), Mosca Iluminada (1972), O Anjo do Ocidente à Entrada do Ferro (1973), Poemas a Rebate (1975), Epístola aos Iamitas (1976), O Dilúvio e a Pomba (1979), Sonetos Românticos (1990), O Armistício (1985), O Sol das Noites e o Luar nos Dias (1993), Memória da Sombra (1994, com fotos de António Matos). Ficção: Anoiteceu no Bairro (1946), A Madona (1968), A Ilha de Circe (1983). Teatro: O Progresso de Édipo (1957), O Homúnculo (1965), O Encoberto (1969), Erros meus, má fortuna, amor ardente (1981), A Pécora (1983). Ensaio: Poesia de arte e realismo poético (1958), Uma estátua para Herodes (1974). Obras várias: Descobri que era Europeia (1951 - viagens), Não Percas a Rosa (1978 - diário), A questão académica de 1907 (1962), Antologia da Poesia Erótica e Satírica (1966), Cantares Galego-Portugueses (1970), Trovas de D. Dinis (1970), A Mulher (1973), O Surrealismo na Poesia Portuguesa (1973), Antologia da Poesia Portuguesa no Período Barroco (1982), A Ilha de São Nunca (1982). (Poesia Portuguesa)

Extraído do sítio Poesias e Prosas

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