28 de maio de 2012

NO PAÍS DO NÃO-SENSO - Víctor Bandarra



Quantos portugueses já viram um bacalhau vivo ou recém-pescado? Poucos, muito poucos. E no entanto, o bacalhau é, por consenso, o prato mais português do Mundo. Lembrei-me da questão, perguntado por um amigo brasileiro, ignorante de pescas e de História: "A costa lusitana deve estar cheia de bacalhau, pois não?" Pensei: que povo estranho se dá ao luxo de ter por prato nacional um bichinho pescado a milhares de quilómetros de casa. Expliquei-lhe que a isso nos obrigou a pobreza e hoje, por uma questão de não-senso, insistimos no bacalhau…

A propósito, citei-lhe uma crónica de Vinicius - "O não-senso é uma forma de espírito que só serve quando inocente". O brasileiro fitou o horizonte: "Vocês são um país de poetas, pescadores e marinheiros". Que inocente! Pessoa incensava um tal Bandarra, que nos entregou nos braços do fatalismo sebastiânico. Um fatalismo que nos fez vender os barcos ao desbarato e a poesia a quilo. De marinheiros, navios e cacilheiros restam-nos as letras de fado. E pensar que, após o mais longo reinado de um ditador, Portugal só constou de novo no ‘Guinness de Recordes', por não-senso, graças a um bombeiro de Leiria (lembram-se?) que pedalou dias a fio à custa de bifes debaixo do traseiro. Quanto a Saramago, por bom senso, foi olhar o mar para Lanzarote.

Há uns anos, nacionalistas do burgo chocaram-se com um artigo do ‘El País' sobre Lisboa. O autor notava o não-senso da cidade - tem uma avenida da Liberdade que desemboca na Penitenciária, um cemitério dito dos Prazeres e até um Tribunal da... Boa-Hora. E nem sequer lhe explicaram porque chamam ‘tripeiros' aos portuenses...

No país do "se calhar", do "podia-me tirar um café" e dos comentadores avençados fingidores de bom senso, demos por ela a exportar cidadãos licenciados, gente que um dia, por bom senso, há-de abandonar o pastel de bacalhau e chegar ao emprego à hora certa. Mas que, com o não-senso do costume, há-de continuar a defender a tese amiguista do costume - "Para os amigos tudo, para os inimigos nada! Quanto aos restantes... cumpra-se a lei".

O meu amigo Zé dos Pneus, fadista masoquista, acredita que o cúmulo do não-senso vai ser, não o fim do euro, mas uma final do Euro entre Portugal e a Grécia. "E os gregos voltam a ganhar, não com um alemão à frente, mas com um português! Isso é que é não-senso!" Pensando bem, só a Grécia nos bate em não-senso: o partido nazi grego é... anti-alemão.

Extraído do sítio Correio da Manhã

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