Estudantes tomaram as ruas para defender um interesse que é de toda a população (Foto: Ramiro Furquim/Sul21).
A decisão judicial que obrigou a prefeitura de Porto Alegre a recuar no tema do aumento da passagem de ônibus, coroou de êxito a massiva mobilização estudantil que levou milhares de pessoas para as ruas da capital gaúcha nos últimos dias. O povo mobilizado na rua defendendo um interesse público mostrou, mais uma vez, que sempre existe alternativa, que a lógica do “não tem jeito de ser diferente” só funciona quando o princípio da inércia opera. Estão de parabéns os milhares de estudantes que se mobilizaram e saíram às ruas para defender um interesse que é de toda a população que utiliza transporte coletivo. Estão de parabéns também os vereadores do PSOL de Porto Alegre, Pedro Ruas e Fernanda Melchiona, que tomaram a iniciativa de ingressar com uma ação na Justiça para revogar o aumento que havia fixado a passagem em R$ 3,05. É de se esperar agora que a energia social mobilizada nestas manifestações sirva como combustível e inspiração para discutir outros problemas da cidade e do Estado.
Outra vitória do movimento dos estudantes foi superar preconceitos e estereótipos destilados na mídia da capital nos últimos dias. Colunistas de opinião fizeram fila para ecoar as palavras do prefeito Fortunati que tentou colar o rótulo de “baderneiros” nos estudantes. O tiro saiu pela culatra e os “baderneiros” venceram. Venceram porque conquistaram o apoio de uma parcela expressiva da opinião pública. E conquistaram esse apoio porque a causa era justa e porque a cidade onde vivem sofre um processo de crescente subordinação do interesse público a interesses privados. Não é a única. A novidade é que, aqui, a população, liderada pelos estudantes neste caso, começou a reagir. Os diversos impactos provocados na cidade pelas “obras da Copa”, por estarem afetando diretamente a vida de milhares de pessoas, representam uma oportunidade para levar esse debate e essa mobilização adiante. Os verdadeiros “baderneiros” podem estar em outro lugar.
Um alerta sobre a ocupação e os limites de Porto Alegre
Em 2010, entrevistei o geólogo Rualdo Menegat, professor do Departamento de Paleontologia e Estratigrafia do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, para o Adverso, publicação da Associação dos Docentes da UFRGS. O tema original da entrevista girava em torno dos grandes terremotos que tinham atingido na época o Haiti e o Chile. Mas a conversa acabou indo bem além desses fenômenos e tratou da degradação da relação entre a civilização e a natureza. Para Menegat, o único fenômeno novo que esses terremotos mostraram é a progressiva cegueira da civilização humana em relação à natureza. Ele alertou ainda que a humanidade está bordejando todos os limites perigosos do planeta Terra, aproximando-se cada vez mais de áreas de riscos, como bordas de vulcões e regiões altamente sísmicas. E ele falou algo muito importante em relação a Porto Alegre.
“Estamos ocupando locais que, há 50 anos, não ocupávamos. Como as nossas cidades estão ficando gigantes e cegas, elas não enxergam o tamanho do precipício, a proporção do perigo desses locais que elas ocupam. Porto Alegre não está livre desse fenômeno. A ocupação desenfreada de morros e de áreas próximas a eles, por exemplo, está gerando zonas de riscos, com densidade populacional, que podem ser palco de tragédias futuras. Outro exemplo é a poluição do Guaíba. Nós conseguimos infestar um importante corpo de água que é o Guaíba. Emporcalhamos a água que usamos para beber. Isso não é cegueira? Que ser vivo no planeta polui a própria água que bebe?”
E acrescentou:
“O nosso sistema cultural, por dar as costas tão violentamente à natureza, está sofrendo enormemente. Essa civilização excessivamente urbana que esquece do meio ambiente está sofrendo e tem gente que chama isso de vingança da natureza. Mas o universo não é um ser animado que se vinga. O que ocorre é uma falência cultural da civilização que, por ser muito grande, tornou-se autônoma em relação à natureza, ou melhor, tornou-se cega à ela. E a mídia contribui enormemente para isso, ao espetacularizar essas tragédias naturais”.
“Quem decide onde você vai morar?”
Por falar em ocupação territorial desenfreada e limites urbanos, nesta sexta-feira (5), a partir das 19 horas, ocorre o Seminário “Quem decide onde você vai morar? Deslocados internos e o debate sobre megaeventos”, no Salão Nobre da Faculdade de Direito da UFRGS, (João Pessoa, 80, Centro, Porto Alegre). O evento está inserido na programação da V Semana de Direitos Humanos do SAJU/URFGS e tem como propósito aproximar o debate do direito de moradia, as mudanças do tecido urbano e social, as remoções, dando enfoque aos megaeventos sediados no Brasil.
O debate reunirá moradoras/es de comunidades removidas e em processo de regularização, estudantes, grupos de assessoria popular, representantes de movimentos populares que hoje lutam pela efetivação de direitos humanos fundamentais.
Extraído do sítio Sul21
Extraído do sítio Sul21
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