4 de julho de 2012

EPITÁFIO - Paulo Mendes Campos



Se a treva fui, por pouco fui feliz. 
Se acorrentou-me o corpo, eu o quis. 
Se Deus foi a doença, fui saúde. 
Se Deus foi o meu bem, fiz o que pude. 
Se a luz era visível, me enganei. 
Se eu era o só, o só então amei. 
Se Deus era a mudez, ouvi alguém. 
Se o tempo era o meu fim, fui muito além. 
Se Deus era de pedra, em vão sofri. 
Se o bem foi nada, o mal foi um momento. 
Se fui sem ir nem ser, fiquei aqui. 

Para que me reflitas e me fites 
estas turvas pupilas de cimento: 
se devo a vida à morte, estamos quites. 


Paulo Mendes Campos (Belo Horizonte, 28 de fevereiro de 1922 - Rio de Janeiro, 1 de julho de 1991) - Além de poeta, foi cronista, jornalista e tradutor. Publicou em poesia: 'A Palavra Escrita', 'Testamento do Brasil' e 'O Domingo Azul do Mar'. Destacou-se nas crônicas, que, ao lado de Rubem Braga, Fernando Sabino e outros, mudaram a maneira de fazer crônicas no Brasil. Diversos livros com reuniões de suas crônicas como 'O Cego de Ipanema', 'Os bares morrem numa quarta feira', foram republicados.


Extraído do sítio Palavrarte

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